Acabou a polêmica. Com direito a uma linda foto estilo Rodin
na capa de Zero Hora, Gabriel, o Pensador aceitou a tradição dos escritores
gaúchos. Desistiu do cachê de 170 mil reais e vai ser Patrono da 27ª Feira do
Livro de Bento Gonçalves sem ganhar nada. Há exatamente trinta anos, Moacyr
Scliar fez o mesmo quando foi Patrono da Feira do Livro de Porto Alegre. Assim
fizemos todos nós, seus colegas destas plagas do sul, quando tivemos a honra de
ocupar esse posto. E acho que isso responde a pergunta do Diretor-geral do
Tribunal de Contas do Estado, Valtuir Pereira Nunes, quando julgou interessante
averiguar se os agraciados recebem algum valor por isso.
Não, senhor, não ganhamos nada. E não porque somos bobos. Se
o Fabrício Carpinejar aceitara receber um cachê de mil reais para participar da
mesma Feira (e desistiu disso ao saber o que o Gabriel ganharia), foi
simplesmente porque desejava que o evento fosse realizado, mesmo com as
dificuldades de recursos que limitam todas as atividades culturais. Ou alguém
ficou feliz em tomar conhecimento, na mesma reportagem, que as duas bibliotecas
mantidas pela Secretaria de Cultura de Porto Alegre recebem apenas dez mil
reais por ano para sua sobrevivência?
No Conselho Estadual de Cultura, costumamos dizer que o
maior inimigo nosso no Rio Grande do Sul é o 007. Não o James Bond, é claro,
mas o percentual de 0,07 do orçamento gaúcho dedicado à área cultural.
Em programa da Rádio Gaúcha realizado na madrugada do Dia do
Livro, Cyntia Moscovich, Ivan Pinheiro Machado e eu não criticamos Gabriel, o
Pensador porque ia receber um cachê tão elevado numa Feira do Livro. Valorizar
sua arte (e ele é um músico de grande valor e um escritor distinguido com o
Prêmio Jabuti) não desmerece nenhum profissional. O que ninguém estava
entendendo é porque recursos tão generosos estavam sendo direcionados para um
único escritor, enquanto seus colegas continuariam recebendo cachês
insignificantes.
Aceitando ombrear-se conosco na tarefa árdua de manter a
cultura gaúcha com algum prestígio, mesmo sem verbas para atividades fundamentais,
Gabriel assumiu em definitivo seu novo título. Desistir de um cachê digno de um
Gabriel Garcia Marques demonstra o quanto ele deseja, realmente, investir seu
talento na literatura. Bem vindo entre nós, Gabriel, o Escritor.
Alcy Cheuiche
Escritor
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